Páginas

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Alguns desesperos

Alguns desesperos traduzem nada mais que o mais tolo medo de não dar conta do tempo: O tempo morreu, e em seu lugar temos o mercado do tempo, o tempo que sempre está no limite, o tempo que não se pode aproveitar. Alguns desesperos são expressões máximas da vontade de viver, incompatível com as bio-regras que são muito mais anti-bio! Teu desespero é parecido com o meu, e estes se parecem muito com o desespero do mais comum ¹ser que existe. Um silêncio absoluto, um copo de água, mãos frias, mãos tremendo, corpo tremendo. Lágrimas que simbolizam a agudez do findar do tempo: Alguns desesperos sangram, outros surram, outros,calam.

1. Os critérios para ser comum são: qualquer critério ou nenhum critério.


Abaixo, "The little deer" de Frida Kahlo (1946)



sexta-feira, 23 de setembro de 2011

desabafo

A chuva não traz apenas frio e humidade para a terra; traz para o meu coração um assombro terrível, uma certeza de que nada é único, de que não há singularidade, certeza de que tudo é efêmero. Uma árvore pode viver mil anos ou mais, mas um dia ela morre. Uma palavra leva segundos para ser dita, mas pode ser eternizada para além de mil anos. Fico bem parada, para sentir a frieza do vento, representando a frieza da vida, lembro de Buda sem ser Budista – não sou nada – mas compreendo que a vida é sofrimento, intenso, profundo e cíclico. Olho a chuva, não ouço se quer uma palavra, não falo, apenas sinto rasgar dentro do meu coração alguns sonhos inocentes desenhados durante esses insignificantes anos da minha vida. Posso morrer hoje ou amanhã, poderia ter sido ontem, quem se importa. A importância tem prazo de validade, como a vida, como o amor que não é amor. Temo não saber o que é amor, mas sei que posso descobri-lo, como o tempo descobre todas as faces da vida e da morte. Sinto-me nada mais que um corpo absorvido em sua total individualidade, uma onda furiosa, um pássaro a cantar sozinho num campo de profunda solidão. Sinto como se eu fosse a noticia de um desastre, uma terrorista. E quando chove assim, todos os bichos que habitam em mim, tornam-se mais humanos, isso pois, aqui fora, tenho uma vontade imensa de chorar.

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

As vozes dos poetas vivos e dos mortos compunham uma sintonia de finos acordes longos, quando lembrei de quando vi uma pata no espelho. Mas gritou-me qualquer grito – Ganso que tu és! Oh pata enfurecida. – Deleitei-me em sentir a brisa macia, sentir o abraço refletido eternamente em meus braços. Já não é mais ganso! – na voz de qualquer menina. A estrutura mostra na postura um golfinho manso de essência azul celeste, como quando a gente se livra de uma peste e dorme tranquilo na grama. Existem fatos e fatos y uma exposição pós-moderna dentro de meus pensamentos, dúvidas, esfinges, arte rupestre no terrero de candomblé rolando um jazz assim tão bom. Chegou o bem-te-vi, chegou o lobo. Foi embora a mulher o homem e a razão.

Viagem

Um dia desses, passeando por nuvens carregadas de chuva
Deus me disse – vai pra Lua, lá tem o que procura!
Agarrei-me num pássaro a voar, e na Lua ele me deixou.
Vaguei dias e dias, sempre a cantar e a dançar
Quando, de repente, avistei de longe uma tempestade
Que por mim se apaixonou.
Viajei milhas e milhas com a tempestade
Que mais parecia uma metade da vida que perdi no caminho.
Ao chegar em Vênus, a tempestade foi embora
E todo amor terei que carregar sozinha, viajando pelo universo.
Compondo rimas e versos, como uma loba a uivar
Na noite, no inverso do que um dia parecia meu destino.


Implicância


Mordi a maçã errada para só depois ficar calada
Subi todas as escadas e não encontrei absolutamente nada
Desci frustrada e cansada, deparei-me com um espelho.
Que coisa hilária, eu parecia mais uma pata!

Um saco cheio das coisas do mundo!

Da dor que dói agora:
A dor que me foi doada
É apenas um sintoma
De uma mente atordoada!

Da ética histórica:
Um egoísmo fajuto
Expresso na raiva
Que dura um minuto.

Da clínica:

Lentamente recupero o fôlego
Perdi muito tempo
Nesse compasso cômico.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Um gole e um passo
Firmeza na voz
Fibra no braço
Apenas um passo
para inferir na
Estrutura crítica
do espaço.
Um campo e um traço
Ao qual junto me faço
E me desfaço
Num dialético laço.

Diego Zamura e Lucineli Pikcius